segunda-feira, 11 de maio de 2015

10. A Menina e a Pomba Urbana

- Mas eu não estou entendendo nada do que você está falando! – exclamou a Menina, aflita.
- Caga na cabeça! Caga na cabeça! – continuou a Pomba Urbana, em fluxo. – São 150 pombos para um velhinho jogando migalhas! Quem não come não vive! Cuidado com o carro! Já era: pomba no asfalto!
- Eu não consigo com toda essa loucura... – desabafou a Menina.
- A loucura não é nossa, Menina. – respondeu a Pomba Urbana, subitamente profética. – Nós, pombas urbanas, somos meros espelhos, reflexos orgânicos da cidade agitada.
- Então você tem momentos de lucidez?
- Menino com estilingue no telhado! Desviar da roda! Desvia do gato! Nossos ninhos ficam escondidos no alto, nas dobras dos viadutos e estátuas. As pombas filhotes piam, piam...
- Não deve ser uma vida fácil. – Concluiu a Menina, intrigada.
- A vida não é uma coisa medida em facilidades, Menina. A sobrevivência que é assim, há momentos fáceis e momentos difíceis de sobreviver. Mas a vida... A vida...
- A vida...? – continuou a Menina, esperando uma resposta.
- Migalhas! Senhora a oeste jogando migalhas! – exclamou a Pomba Urbana. E foi embora, sem se despedir, voando em direção ao outro lado da praça, junto com dezenas de outras pombas urbanas, disputar as migalhas jogadas pela velhinha.
Naquela noite, a Menina teve um sonho estranho. Sonhou que a cidade inteira era um grande manicômio com muros bem altos e ela, a Menina, era uma pomba, que alçava voo com suas asas. E voava. Para além dos muros.



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